Você está no piloto automático!
Você já assistiu ao filme "Click"? É um filme bastante antigo, mas que gera uma reflexão interessante. Se você ainda não o viu, vou dar um spoiler e convidá-lo(a) a assisti-lo. Pode ser uma boa distração para o final de semana.
No filme, o protagonista, insatisfeito com a correria de sua vida e com a demora para alcançar seus objetivos, vai até uma loja misteriosa e recebe um controle remoto que promete avançar momentos indesejados de sua vida. Ao começar a utilizar o controle, ele percebe que pode até acelerar a velocidade do tempo, podendo pular anos.
Uma cena que me marcou, e que devo ter assistido há uns 10 anos, foi quando ele pede para pular o tempo até o dia em que recebe uma promoção no trabalho que ele desejou muito. Embora seja um filme de comédia, se pararmos para pensar, assim como o protagonista desse filme, muitas vezes estamos no piloto automático.
Você acorda, escova os dentes, sai para trabalhar, volta para casa e, quando percebe, já está indo dormir novamente. A vida vai passando e você nem percebe. Chega o final do ano, você olha para o ano que passou e se frustra, percebendo que avançou pouco, inclusive em relação às metas financeiras que estabeleceu.
Mas por que isso acontece com tanta frequência em nossas vidas?
Uma explicação para essa tendência de entrarmos no piloto automático é dada por Daniel Kahneman no livro "Rápido e devagar: duas formas de pensar". Segundo o autor, nosso comportamento pode ser rápido, intuitivo (Sistema 1), ou lento, analítico e deliberativo (Sistema 2).
O comportamento rápido é chamado de Sistema 1. Por exemplo, se eu te perguntar quanto é 2 + 2, você me dará a resposta rapidamente, sem precisar pensar. Isso não é necessariamente ruim, afinal, é o nosso Sistema 1 que tem todo o senso de sobrevivência e nos permite ter uma resposta rápida quando estamos em perigo.
Por outro lado, o Sistema 1 está sempre tentando governar as decisões do Sistema 2. Tomar decisões lentas, reflexivas e analíticas é custoso para o cérebro, portanto, estamos sempre tentando simplificar esse processo de decisão. Escolhas complexas são frequentemente simplificadas para serem tomadas de forma rápida e intuitiva.
Um exemplo disso é quando você está em uma loja e vê um item em promoção que desperta seu interesse. Seu "Sistema 1" entra em ação, fazendo com que você se sinta atraído pela ideia de adquirir o produto imediatamente. Ele pode levar em consideração fatores como o preço reduzido, o prazer de possuí-lo ou até mesmo a pressão social de aproveitar a oferta.
No entanto, seu "Sistema 1" pode estar sendo impulsivo nessa decisão, não levando em consideração sua situação financeira. Ele pode ignorar fatores importantes, como se você realmente precisa do item, se está dentro do seu orçamento ou se existem outras prioridades financeiras mais importantes no momento.
Então, qual é a solução?
Para contrabalançar o impulso do "Sistema 1", é necessário que o "Sistema 2" entre em ação. O "Sistema 2" é responsável pela reflexão consciente e pela análise cuidadosa das decisões financeiras. Ele considera fatores a longo prazo, como metas financeiras, necessidades básicas, planejamento de gastos e economias.
Quando o "Sistema 2" está envolvido na gestão financeira pessoal, você pode avaliar a real necessidade do item, seu valor em relação às suas metas financeiras e se a compra se encaixa em seu orçamento. Essa reflexão consciente permite que você tome decisões mais alinhadas com seus objetivos financeiros e evite gastos impulsivos que possam impactar negativamente suas finanças a longo prazo.
O objetivo dessas reflexões é fazer com que você saia do piloto automático e não corra o risco de tomar decisões incoerentes com seus objetivos. No entanto, saiba que não é simplesmente uma questão de dizer "agora quero que meu Sistema 2 entre em ação". Se fosse assim tão fácil, todos nós tomaríamos ótimas decisões financeiras.
A questão aqui é reconhecer que temos essa tendência de automatizar nossas decisões e, ao ter consciência disso, permanecer atento(a) para que, diante de uma escolha a ser feita, possamos parar e refletir, acionando o Sistema 2. Nas primeiras vezes, pode ser mais difícil, e você precisará treinar seu cérebro, assim como faz ao praticar um exercício físico, mas com o tempo, isso tende a se tornar mais fácil.
Mesmo assim, não se iluda achando que a partir de agora estará sempre recrutando seu Sistema 2 para tomar decisões. Você vai falhar, e isso é natural, assim como é natural escorregar em uma dieta. No entanto, o que importa não é o doce de hoje, mas o somatório do que você faz diariamente.
O comportamento financeiro consciente é uma construção, e estamos aqui para construí-lo juntos.
Se quiser se aprofundar mais no entendimento do sistema 1 e 2 te convido a assistir esse episódio do podcast
Para leitura, vou indicar um livro distante dos números, que parece inclusive um livro infantil, mas que na verdade é um mergulho profundo com você mesma: