18/3/2023

#2 - Finanças comportamentais: a verdade sobre suas decisões com o dinheiro

Quando se fala de dinheiro, muitos pensam que basta somar e diminuir, encontrar a alternativa que gere mais lucro e pronto, a vida financeira está resolvida.Só que não.
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Finanças comportamentais: a verdade sobre suas decisões com o dinheiro

Quando se fala de dinheiro, muitos pensam que basta somar e diminuir, encontrar a alternativa que gere mais lucro e pronto, a vida financeira está resolvida.

Só que não.

Ao decidirmos sobre como iremos utilizar o nosso dinheiro e inclusive, os meios aos quais vamos buscar recursos, somos induzidos por inúmeros aspectos, nada racionais.

Vamos conhecer a história da Claudia (nome fictício), para perceber na prática, como emoções e padrões automáticos são determinantes na forma como lidamos com o dinheiro.

1) O retrato de que nossas decisões financeiras não são racionais

Eu estava começando mais um processo de mentoria. Como de praxe, a primeira sessão é direcionada ao diagnóstico comportamental.

Quando fui montar o diagnóstico da Claudia, já percebi que havia uma dor muito forte ali.

Claudia, ainda jovem, viveu dois momentos de forte impacto emocional, que repercutiram em sua vida adulta e principalmente na sua relação com o dinheiro.

Tudo começou quando ela tinha 12 anos. Claudia era uma menina serelepe, sempre atenta, gostava de se comunicar e sabia tudo que acontecia na vida da redondeasse. Certa noite começou a desconfiar do comportamento do seu pai, e daquele dia em diante não sossegou, até que descobriu uma traição. Não era qualquer traição, seu pai estava se relacionando com a melhor amiga da sua mãe e ela não tinha a menor ideia de como iria contar o que havia descoberto.

Certo dia, vendo sua mãe apreensiva com a demora de seu pai, não aguentou segurar aquele segredo, e contou a mãe o que havia descoberto. Sua mãe, em um primeiro momento não acreditou e a vida de Claudia, daquele dia em diante, não teve mais sossego.

O problema tomou uma proporção que ela jamais esperava. Entre as inúmeras discussões entre seus pais, até que o divórcio efetivamente acontecesse, uma foi marcante para Claudia. Ela escutara seu pai gritando, falando que não queria ter tido filha, que se casou só por causa da gravidez e que tudo que estava acontecendo era apenas o resultado de um casamento que nunca tivera de ter existido.

Resultado, Claudia entendeu, daquele dia em diante, que todos os problemas da vida dos seus pais eram sua CULPA, e que ela nem deveria ter nascido.

Para piorar a situação, seu pai que já enfrentava problemas na empresa que possuía, acabou falindo, pouco tempo depois da separação.

Resultado: Claudia sentia-se culpada de toda a situação e para piorar, passava por dificuldades financeiras. Ela e sua mãe tiveram que morar de favor e mal tinham o que comer.

Na vida adulta, Claudia simplesmente reproduziu esses padrões. Estava completamente endividada, não conseguia se manter em nenhum emprego e nunca havia tido um relacionamento saudável. Essas coisas todas eram reforçadas pelas próprias crenças de Claudia, se seus pais eram infelizes por causa dela, ela também não poderia ser feliz, se seus pais tiveram problemas financeiros ela também não tinha o direito de ter uma vida abundante, se a culpa da separação era dela, ela não poderia ter um casamento saudável.

A relação que Claudia tinha com o dinheiro era completamente distorcida.

2) O que aconteceu com Claudia, do ponto de vista científico?

A história de Claudia pode parecer surpreendente, mas a verdade é que há muitas e muitas histórias como essa por aí. Vamos buscar entender as suas consequências, pela ótica da teoria de finanças comportamentais.

Até 1979, quando a base da teoria de finanças comportamentais foi publicada (Teoria do Prospecto), as decisões financeiras eram vistas como racionais, ou seja, nas condições de Claudia, de forma alguma o que ela viveu na adolescência poderia influenciar as escolhas financeiras na vida adulta.

Entretanto, Daniel Kahneman e Amos Tversky criaram um novo olhar sobre as decisões financeiras.

Todos nós precisamos ser imensamente gratos ao trabalho desses caras, afinal de contas, como entenderíamos nossas escolhas, se achássemos que tudo se resumia a um cálculo.

Eles esclareceram várias das nossas escolhas, indicando que:

  • Preferimos os ganhos certos. Aquele velho ditado: mais vale um pássaro na mão do que dois voando faz todo sentido;
  • Somos avessos ao risco. Não queremos perder e inclusive, perder gera uma dor 2 vezes maior do que a felicidade com os ganhos. Com isso, a dor tem maior impacto emocional, fica mais registrada em nosso cérebro;
  • Avaliamos as coisas a partir do nosso ponto de referência, portanto, 100 reais para uma pessoa que ganha R$1.000,00 é diferente de 100 reais para uma pessoa que ganha R$5.000,00

Esses resultados foram identificados a partir do mapeamento de como as pessoas escolhiam entre várias alternativas, tais como 50% de chance de ganhar R$1.000,00 ou 100% de chance de ganhar R$500.

Mas, se fomos trazer para nossas escolhas diárias, conseguimos compreender boa parte do nosso comportamento.

Vamos olhar para Claudia e comparar seu comportamento com cada um desses pontos:

  • Claudia, ao longo da vida, nunca arriscou, sempre buscou empregos aos quais ela sentia-se extremamente confortável, para não correr o risco de ficar sem. Isso fazia com que ela não se desafiasse, não buscasse evoluir, não saísse da sua zona de conforto pelo medo no novo, como consequência, acabava não desempenhando um papel excepcional em suas funções e logo era substituída;
  • Ela viveu muitas dores, isso ficou registrado de forma sólida em suas memórias, e como as dores são mais relevantes que os ganhos, mesmo que aconteçam coisas boas na vida dela, sem um devido acompanhamento psicológico, dificilmente ela conseguira alterar a sua visão de mundo. Sua visão de mundo é de que o perigo está sempre na porta, e que ela está prestes a falir novamente, seu medo potencializa sua aversão ao risco;
  • Por fim, seus pontos de referência foram todos distorcidos. Ela acredita que a culpa do relacionamento dos seus pais ter dado errado é dela, ela tem certeza de que não merece ser feliz, ter dinheiro e viver de maneira abundante, isso porque ela é o motivo dos problemas de sus pais. Esses pontos de referência determinaram como ela pensa, interpreta, se relaciona e reage diante do mundo.

Todos esses aspectos influenciam na visão de mundo de Claudia e na visão que ela tem em relação ao dinheiro.

E você pode estar se perguntando, como nessas condições ela ainda se endividou, ela não era cautelosa e tinha medo de ficar sem dinheiro? Sim, mas ao sentir-se muito mal com os problemas que enfrentava, comprar era uma estratégia de regulação emocional, como uma alternativa para ter o mínimo de prazer, para sentir-se de alguma forma amada por ela mesma.

Ela não tinha a menor ideia de todas essas consequências e reações, mas suas experiências passadas seguiam determinando com ela agia, pensava e reagia ano muno. As consequências financeiras e emocionais eram negativas.

3) O que Claudia, e todos nós, podemos fazer para tornar nossas decisões mais racionais?

Provavelmente, agora, com um exemplo claro como o da Claudia, você entendeu como o seu comportamento pode ser determinado pelas suas experiências, isso pois, suas experiências te condicionam na forma de pensar, agir e sentir.

Portanto, para introduzir um comportamento financeiro mais consciente, o primeiro passo é você entender o que aconteceu com você na infância, na adolescência, que pode explicar o motivo pelo qual você está tendo os resultados e comportamentos atuais.

Claudia, ao entender que suas constantes trocas de emprego estavam relacionadas a sua busca por uma segurança extrema, inclusive, na sua limitação de buscar novos aprendizados. Ao entender que as dores que viveu fizeram dela uma pessoa pessimista e medrosa e ao perceber que seus pontos de referência

Todos esses exercícios tinham como objetivo alterar a visão de mundo de Claudia, possibilitando que ela pudesse ser mais racional e consciente de suas decisões, sem generalizar e distorcer a sua análise com a ótica de quando tinha 14 anos de idade.

Lembre-se sempre, Não mudamos aquilo que não conhecemos, portanto, mesmo que seja doloroso relembrar todos os seus medos e angustias, o faça, você poderá ter boas respostas em relação aos seus resultados.

Meu compromisso, ao fazer divulgação científica é trazer ferramentas que te tornem capaz de realizar uma análise crítica sobre você mesma.

Com isso, entendendo o seu comportamento, você será capaz de mudar sua própria realidade.

“Quando você faz uma reflexão sobre seus padrões individuais de resposta, sabe que, ao interpor um pequeno espaço de tempo entre a sensação imediata e2 a sua reação instintiva, está se permitindo permanecer presente e acabará recuperando o controle” (Perry, 2022)

Se você quer se aprofundar nos conceitos discutidos aqui, sugiro que assista esses dois episódios do podcast Mais Q Finanças:

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